na madeira estreita da tua paisagem, no encosto da tua cabeça, estilizada atrás de ti como uma linha ténue e flutuante que torna a tua pele mais branca e luminosa, estilhaço os olhos como um medo de te olhar na vulnerabilidade completa da tua beleza nua. deitado, talvez a dormir, não sei, só no meu sonho, distraído, tu ali assim, como um poema ou uma cascata de fumo, à espera que eu recolha os jardins suspensos, os faróis e as pirâmides para tos dar, para tos pousar sobre o ventre quente, para te acalmar o sono da morte lenta e dançável. tu, como uma criança pequena que cabe na minha mão, como um enigma universal que não cabe na minha cabeça, como apenas mais um ser tão igual aos outros que me mete impressão que te veja de forma tão diferente. mas eis o que há em ti, o sono, já contei a história a mim mesmo que me tinha trazido até ti, vou-me agora embora para o mundo onde não existes sequer porque não há mulheres tão belas como tu que durmam e me façam pensar tudo isto. só no meu sonho. distraído. a dormir também, talvez, em pé. em pé e no autocarro, no metro, nas ruas, nos cafés, sempre a dormir em pé em todos os sítios desde que acordo de manhã até voltar a adormecer à noite. porque é isso que faço, durmo sobre mim mesmo e sonho para mim mesmo todas as coisas possíveis de acontecer num dia em que não estivesse a dormir tanto que não conseguisse estar acordado. mas quando acordo realmente, em efémeros e estonteantes segundos-vácuos à velocidade da luz, penso no que me fará dormir tanto, porque o mundo até é bonito quando se está acordado e se olha para as coisas sem sonhar como elas seriam se estivéssemos acordados. tudo isto consegue ser um bocadinho mentira porque eu até acho que vivo bem acordado, depende da perspectiva. acordo, de manhã, para mim mesmo e para o que há dentro de mim e do meu sonho: o mundo corre na estrada da minha sensação e subjectividade, mas não será assim que correm todos os mundos? eu não sei. não deve haver modo de saber, de qualquer maneira. mas gosto de sentir o mundo correr por dentro de mim, quando subo aquelas ruas e canto para dentro as músicas que gosto de ouvir e olho para as casas e sei sonhar o que lá está dentro, assim como sei sonhar os meus pensamentos e os das outras pessoas de acordo com o mundo que é aquele a sério, sem estradas nem movimento.